
Ministro Luiz Fux durante sessão no STF em que votou pela anulação do processo da trama golpista, divergindo de Alexandre de Moraes e Flávio Dino.
O julgamento da chamada trama golpista no Supremo Tribunal Federal ganhou novos contornos após o voto do ministro Luiz Fux, que divergiu dos colegas Alexandre de Moraes e Flávio Dino. Em sua manifestação, Fux votou três vezes pela anulação do processo, apontando incompetência da Corte para julgar o caso, defendendo que a ação deveria ser analisada pelo plenário e alegando que houve cerceamento de defesa.
Para o ministro, nem Jair Bolsonaro (PL) nem os outros sete réus do processo possuem prerrogativa de foro. Ele afirmou que os crimes investigados ocorreram entre 2020 e 2023 e que, à época, a jurisprudência era clara: cessado o exercício do cargo, cessava também o foro privilegiado. Por isso, no seu entendimento, a ação deveria tramitar na primeira instância da Justiça Federal.
Esse posicionamento contrasta diretamente com o entendimento consolidado pelo STF em março deste ano, que definiu que casos relativos ao 8 de janeiro e conexos devem permanecer na Corte, mesmo quando o inquérito ou a ação penal tenham sido abertos após o término do exercício do cargo. Foi com base nessa tese que Bolsonaro e ex-ministros foram mantidos como réus na Suprema Corte.
O voto de Fux foi interpretado como um gesto de alinhamento às críticas feitas pela defesa dos acusados contra a condução do relator Alexandre de Moraes. O magistrado concordou com vários dos argumentos das defesas, como a alegação de nulidade em decisões de Moraes e a dificuldade para analisar o enorme volume de informações apresentadas ao longo da investigação, que chamou de “tsunami de dados”, comparando ao “document dump” do direito anglo-saxão.
Mesmo reconhecendo falhas processuais, Fux não endossou todos os pedidos da defesa. Ele manteve a validade da delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, afirmando que o militar colaborou sempre acompanhado de advogados e que as advertências feitas por Moraes sobre o risco de prisão em caso de descumprimento de termos não configuram irregularidade.
No voto, o ministro defendeu ainda que, se o julgamento continuar no Supremo, ele deveria ocorrer no plenário do STF e não na Primeira Turma. Para ele, a gravidade do caso e o número de réus exigiriam deliberação com a participação de todos os ministros da Corte.
Durante sua fala, Fux destacou que juízes precisam ter “firmeza para condenar quando se tem certeza e humildade para absolver quando houver dúvida”, numa referência indireta ao clima de polarização em torno do processo.
A divergência de Fux foi considerada incomum, já que ele participou de todas as etapas do processo desde que Bolsonaro se tornou réu, mantendo acompanhamento próximo dos autos. Assessores e advogados ouvidos por veículos de imprensa interpretaram o movimento como uma tentativa de atuação independente.
Até agora, os votos de Alexandre de Moraes e Flávio Dino foram pela continuidade do julgamento e pela condenação dos réus. Já Fux abriu divergência ao apontar nulidade processual. Os próximos votos de Cármen Lúcia e Cristiano Zanin devem definir o rumo da ação.
Advogados de defesa têm sustentado que a Corte estaria julgando ilegalmente pessoas sem foro especial, argumento reforçado pelo voto de Fux. A Procuradoria-Geral da República, porém, defende a competência do Supremo para tratar dos fatos por causa da ligação direta com os atos golpistas de 8 de janeiro.
Em sua avaliação, manter o processo no STF sem observar a regra do juiz natural e a segurança jurídica seria um vício intrínseco impossível de ignorar. “Estamos diante de uma incompetência absoluta”, afirmou o ministro, ressaltando que esse tipo de falha não pode ser corrigido apenas com atos posteriores.
Fux também alertou para o impacto das divergências jurídicas no debate público, lembrando que, em processos de grande repercussão política, o respeito aos ritos processuais é fundamental para evitar questionamentos futuros e manter a legitimidade das decisões.
A votação continua na Primeira Turma, composta por cinco ministros. Com o placar momentâneo de 2 a 1, a expectativa é que os votos restantes determinem se a ação seguirá válida no Supremo ou se haverá anulação, o que representaria um duro revés para a acusação.
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